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Opinando - Blog de Filipe Azevedo - blog de Filipecanelas

Votos em Braille, uma solução?

por Filipecanelas

Prezados leitores.
Muito se tem discutido sobre o facto de os eleitores deficientes visuais, não poderem exercer o seu direito de voto autonomamente, com o sigilo e o secretismo que é concedido a todos os restantes eleitores.
Obviamente esta é uma questão que me preocupa, porque para além de ser cego sou também um eleitor convicto, e faço sempre questão de participar em todos os actos eleitorais.
Tive conhecimento que um grupo de cidadãos fez uma petição à Assembleia da república, onde defendiam que deveriam ser disponibilizados boletins de voto em Braille a todos os eleitores que os requeiram.
É salutar que as pessoas se organizem em torno de algo que acreditem, e que tentem fazer algo para de facto dar condições aos cegos de votarem com o máximo de dignidade possível.
Mas neste caso a pergunta que devemos fazer é: Afinal em que é que os boletins de voto poderiam ajudar os eleitores cegos?
Penso que é importante fazer desde já uma ressalva. Eu sei que existem muitos deficientes visuais que não sabem ler Braille, sei que também existem muitos concidadãos analfabetos, e talvez por isso se introduzirem os símbolos dos diferentes partidos nos boletins de voto. Mas no que concerne aos Cegos e amblíopes, não é pelo facto de muitos não saberem Braille, que não se pode avançar para uma solução destas, até porque esta solução vai ser apenas um complemento. Isto é, quem não dominar o Braille, e não quiser votar desta forma vai poder continuar a votar da forma tradicional, ou seja, acompanhado. Agora não é pelo facto de muitos não saberem Braille que se vai penalizar os que sabem! Esta é a minha opinião e entendo que é importante referir este aspecto, que é para não começarem já a dizer que muitos coitados não sabem Braille, e portanto tem de se encontrar outra solução. Com certeza que quanto mais forem as soluções melhor. Mas aqui o problema é outro.
A ideia do voto em Braille seria muito boa se não tivesse um handicap em minha opinião muitíssimo limitador. É que dificilmente se conseguia garantir o sigilo do voto do eleitor deficiente visual. E por uma razão muito simples. Numa grande parte das situações só existe um ou quanto muito dois cegos recenseados em cada mesa de voto. Logo se o boletim dessa pessoa ou pessoas fosse diferente era fácil aferir do sentido do voto a quanto da respectiva contagem final.
Se não conseguimos garantir o sigilo do voto, apraz-me perguntar então, para quê fazer um voto diferente? Se virmos bem as coisas, pese embora não ser assim tão linear bastaria o eleitor pedir ajuda ao representante do partido que ele pretendesse votar, ou então caso votasse em branco pedia ajuda a dois representantes.
Obviamente que eu não defendo isso, porque se trata de uma medida absolutamente indigna para o votante. Mas o que eu quero tentar transmitir é que os votos diferenciados, sejam eles em Braille, caracteres ampliados ou de outra espécie, não garantem o sigilo do voto, porque numa mesa eleitoral não existem assim tantos deficientes recenseados como isso.
À no entanto uma alternativa que eu penso poderia ser posta em prática com alguma facilidade e que resolvia este problema do sigilo. Trata-se do voto por correspondência.
Os procedimentos seriam os seguintes:
O eleitor requisitava os votos em Braille ou caracteres ampliados, enviando-os depois para a comissão nacional de eleições. Este processo em minha opinião pode ser facilmente posto em prática, uma vez que os eleitores emigrantes já à muito votam por correspondência. Neste caso bastava apenas alargar esta funcionalidade aos deficientes visuais.
Assim, estava garantido o sigilo do voto, porque os boletins seriam todos enviados para o mesmo sítio.
À apenas uma situação que se pode vir a afigurar mais complexa, que são as eleições autárquicas. Imaginemos que numa freguesia só um deficiente tinha exercido o direito de voto por correspondência, lá se ia o sigilo novamente por água abaixo! No caso das eleições nacionais, penso que este problema nunca existiria de todo.
Quero deixar uma nota importante. Aquilo que eu defendo tem de ser sempre complementar e nunca substituir o que quer que seja. Isto é, os deficientes visuais têm de poder optar se querem votar por correspondência, ou se querem votar acompanhados como até aqui.
Como se viu esta solução não é de todo perfeita. No entanto seria aproveitarmos este espaço para debatermos, e quem sabe, no meio de várias soluções imperfeitas, se venha a encontrar uma que seja realmente ideal!
Certamente que uma grande parte dos deficientes visuais são entusiastas do voto electrónico.
No entanto esta solução só seria perfeita se fosse alargada a todos os concidadãos. Porque se fossem só os deficientes visuais a poderem usar o voto electrónico tínhamos o mesmíssimo problema que encontramos nos boletins em
Braille.
Se todos os eleitores pudessem usar o voto electrónico, aí sim!
As coisas seriam muito mais simples.

Creio que o voto electrónico é uma inevitabilidade, mas enquanto isso, os cegos e amblíopes também gostariam de votar, isto é claro se não for pedir muito!

Abraços para todos.
Filipe

Comentários

Olá Felipe!

Concordo com vc, quanto ao voto secreto.
Aqui no brasil, já praticamente foi resouvido esse problema, em todas as eleições são usadas urnas eletrônicas para todos os eleitores.
Na minha opnião, é um jeito para vc poder exercer sua cidadania de uma maneira secreta.
E, é até mais rápido para obterem os resultados.
As urnas tem o braille, desse maneira, fica muito mais fácil poder votar sem ajuda de outras pessoas.

Mas, em paises que não usam a urna eletrônica, acredito que a votação por meio de correspondência seja a maneira mais tranqüila para votar sem que o eleitor cego precise de outras pessoas para auxiliarem.
Nesse caso, seria enviado para o eleitor, uma cédula em braille e ele poderia ler e enviar seu voto também em braille.

Abraços do WELL!!!

Filipe,

Na minha modesta opinião, perder tempo a argumentar contra ou a favor do voto em Braille é mesmo isso, perder tempo. Está mais do que demonstrado que o voto em Braille seria uma solução transitória. E sê-lo-ia sempre por motivos logísticos, para além dos que o Filipe apontou. E sê-lo-ia ainda mais porque, e o problema é sempre esse, Filipe, a existência de voto em Braille inviabilizaria que o Filipe continuasse a votar acompanhado, a menos que se declarasse analfabeto de Braille, por via da pessoalidade do voto.

Portanto, tudo o que se faça e que não passe por votos electrónicos em sistemas devidamente adaptados - e, claro, em sistemas onde todos os outros votantes exercem o seu direito cívico - é perda de tempo. E em Portugal quem tem que auxiliar o Estado a decidir nestas matérias já há muito que viu que o caminho é esse, e já testou protótipos e continuará a fazê-lo, certamente. Enquanto alguém quiser fazer petições aos órgãos de soberania pugnando por votos em Braille impressos em papel, votos por correspondência ou outros sistemas de votação análogos, estará a mostrar que nem a realidade relativa aos deficientes, vista de uma forma geral, acompanha. Ou seja: nem aqueles que quer beneficiar está a acompanhar.