Está aqui

Universidade discrimina aluna invisual

por Lerparaver

Ana Filipa Graça tem 31 anos e nasceu com retinose pigmentar. Espera concluir a licenciatura em Direito e tornar-se jurista

Aos 31 anos, Ana Filipa Graça sonha ser jurista. Portadora de uma deficiência visual – nasceu com retinose pigmentar – está a terminar em regime nocturno a licenciatura em Direito na Universidade Autónoma de Lisboa (UAL), após ter pedido transferência da extinta Universidade Independente. Mas a estudante tem enfrentado enormes obstáculos para fazer o exame de Direito Processual Civil: “A 10 de Novembro, o assistente da cadeira, Alfredo Mendes, disse-me à hora do exame simplesmente que não poderia fazer a prova e que a faculdade tinha de resolver o problema”, lembra Ana Filipa. O “problema” desta aluna é que devido à sua deficiência visual, faz os exames em computador. “Tenho um software normalíssimo mas como sistema de voz”, conta.

Durante dois meses Ana Filipa trocou e-mails com a Faculdade de Direito da UAL, incluindo com o responsável máximo pela licenciatura, António Pedro Ferreira: “Não consigo perceber porque é que o director do curso tenta apaziguar as coisas, já lhe expus a situação várias vezes”, recorda a aluna. É que o regente da cadeira, o juiz conselheiro Jorge Pais do Amaral tinha autorizado – como está previsto na lei – que a aluna fizesse os exames com suporte electrónico: “Todos os professores me levam a pen ou a disquete, menos este”, queixa-se Ana Filipa.

Em Novembro, a aluna expôs o caso à Inspecção-Geral do Ensino Superior, ao Instituto Nacional de Reabilitação e ao ministro da Ciência e da Tecnologia e Ensino Superior, Mariano Gago. “Fui informada no final de 2007 pela Direcção-Geral do Ensino Superior que a UAL não tinha respondido ao pedido de esclarecimento e que um inspector se deveria deslocar à universidade”, afiança.

Apesar das múltiplas tentativas de Ana Filipa para realizar o exame na segunda fase, em Dezembro passado, tal não foi possível pois a UAL não solucionou a questão.

“O professor não estava na disposição de me levar o exame em suporte electrónico, como todos os outros fazem em função da minha deficiência”, afirma.

O CM teve acesso à resposta que António Pedro Ferreira, director do Departamento de Direito da UAL (que, curiosamente, também é professor de Ana Filipa e lhe fornece os exames em suporte digital), na qual se lê: “O Departamento de Direito não pode, nem deve, intrometer-se nas questões relativas ao modo como os senhores professores concretizam os métodos de avaliação das respectivas disciplinas.”

Depois de ter pago um exame que nunca realizou e de se sentir discriminada por docentes que apregoam o conceito de Justiça, Ana Filipa não desistiu: “Preciso de acabar o curso, além de que o que se passa hoje comigo na UAL pode repetir-se amanhã com outro estudante”, diz.

O CM contactou a 21 de Janeiro o reitor da UAL, o director do Departamento de Direito e o professor em questão. A resposta chegou um dia depois e em comunicado (ver caixa). Nesse mesmo dia, a aluna recebeu uma chamada da universidade: “Ligaram-me a marcar nova data para exame, dia 28 [esta tarde], apesar de ser com o professor – Alfredo Mendes – que em tempos me disse que, tendo eu uma deficiência, não devia sequer estudar.”

RESPOSTA EM COMUNICADO

Um dia depois de o CM contactar a UAL, esta respondeu, em comunicado, que o regulamento permite a estudantes portadores de qualquer deficiência incapacitante realizar todos os tipos de trabalho e que lhes são garantidos todos os meios técnicos indispensáveis à realização das provas. No entanto, a UAL não explica porque razão Ana Filipa não fez o exame em Novembro ou na segunda fase, em Dezembro.

Sofia Rato

Fonte: http://www.correiodamanha.pt/noticia.asp?id=275460&idselect=10&idCanal=1...