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Trabalhadores deficientes são mais valias para as empresas e instituições

por Lerparaver

Quem gere garante que as pessoas com deficiência valorizam as empresas e instituições e não quebram a produtividade. A Silvex emprega 11 trabalhadores portadores de variadas deficiências que souberam agarrar a oportunidade sem qualquer apoio do Estado.

“Silvex. Boa tarde”. Quem ouve esta voz ao ligar para a empresa de plásticos e papéis, sediada em Benavente, não imagina que quem acaba de atender o telefone tem uma máquina de braille em cima da secretária e se prepara para registar o contacto de forma alternativa. É José Pinheiro, 47 anos, invisual desde nascença e um dos 11 profissionais com deficiência que a empresa tem nos quadros. A oportunidade de integrar os quadros da firma que há mais de 20 anos dá oportunidade a pessoas ditas diferentes surgiu há 13 anos. José Pinheiro morava no Barreiro. Quando a colega lhe falou na possibilidade de fazer férias na recepção não hesitou. Tinha 34 anos e as oportunidades no mercado de trabalho tardavam em surgir. Mudou-se de malas e bagagens para o concelho ribatejano e levou a sua namorada, hoje também funcionária da empresa. “A firma proporcionou-me tudo o que tenho. Um emprego, uma família e uma casa que comprei e estou a pagar ao banco”, diz com satisfação o recepcionista, 47 anos. “Esta empresa dá oportunidades a pessoas com deficiência. As outras também poderiam fazê-lo, mas não o fazem”, analisa.

A memória do recepcionista, que fala inglês, francês e italiano com os clientes que ligam para a empresa, é elogiada com frequência. Talvez pelo bom desempenho dos colaboradores o fundador da empresa e actual director encare com naturalidade a existência de um número significativo de pessoas com deficiência na firma. “Aqui nunca se ouve a palavra deficiente. São funcionários como outros quaisquer”, garante Hernâni Magalhães que assegura que a produtividade da empresa nunca foi afectada pela opção que fez. Antes pelo contrário. “Se há prémios de assiduidade eles ganham-nos todos. Nunca faltam. Se é preciso fazer uma ou outra hora extraordinária estão sempre disponíveis”, afirma.

O director não hesita em apontar as desvantagens de contratar pessoas com deficiência: “São nenhumas”, garante o empresário que está a pensar alargar o número de trabalhadores com deficiência. Tudo começou há cerca de 20 anos quando uma jovem com deficiência pediu emprego na fábrica, ainda a laborar em Sacavém. Hernâni Magalhães decidiu acreditar no trabalho da rapariga e nunca se arrependeu. “Sou uma pessoa que gosta de aceitar desafios”, garante o empresário que já chegou a ter mais de 10 por cento dos trabalhadores com deficiência. Entre pessoas com défice intelectual, dificuldades de locomoção, surdos-mudos e invisuais. Os incentivos à contratação de pessoas com deficiências existem, mas a empresa nunca os solicitou. Nem faz questão de divulgar a estratégia porque a considera natural.

Maria Teixeira, 42 anos, funcionária da linha de produção, é um dos exemplos de produtividade. Mesmo durante a entrevista não deixa de montar os pequenos rectâgulos de cartão onde são depois colocados sacos de lixo para escritório. “É um trabalho mais cansativo fisicamente”, admite, mas prefere-o ao trabalho da recepção onde estava antes de José Pinheiro chegar. É assim há 14 anos entre as 8h00 e as 17h00. Maria preserva como ninguém o trabalho que lhe proporciona a subsistência. Comprou casa e iniciou uma vida ao lado de companheiro.

Foi também a instituição onde trabalha que deu uma nova oportunidade de vida a Carlos David, 34 anos, antigo trabalhador da construção civil, que por negligência médica ficou parcialmente invisual. Hoje é auxiliar na Associação para o Bem-Estar Infantil de Vila Franca de Xira. Faz trabalhos de jardinagem e é tratador dos animais da quinta pedagógica da instituição. O tratador, residente na Castanheira do Ribatejo, acaba de dar banho ao cavalo, um antigo campeão de horseball oferecido à instituição. Está na casa desde 2004, altura em que foi contratado ao abrigo de um programa para pessoas com deficiência. “Aqui sinto que sou tratado como igual. É um ambiente mais familiar que empresarial”, diz o funcionário que já comprou casa e tem ainda o sonho de constituir família. Um sonho partilhado pelo recepcionista da instituição, Paulo Ribeiro, 32 anos, que sofre de epilepsia e que até chegar à instituição, há três anos, não via os contratos renovados como funcionário de armazém. O problema de saúde que o condiciona para a execução de algumas tarefas funcionou como factor de discriminação. A política da instituição dirigida por Manuel Martins, premiada em 2006 pela integração de pessoas com deficiência no mercado de trabalho, é bem diferente. “Trabalhando nós a área social temos que ter a preocupação de não excluir”, diz o dirigente que sempre que te projectos em mãos pensa imediatamente em lugares onde possa integrar pessoas especiais. Dos 152 trabalhadores da casa quatro são portadores de deficiência. E a instituição quer aumentar este número. É fundamental a sensibilização e o bom ambiente no seio da instituição. “Há quem se queixe que por vez há alguém que se esquece de alguma coisa. Mas isso é normal. As pessoas são todas diferentes”, defende Manuel Martins que garante que nenhum de nós sabe como estará no dia de amanhã. “Todos gostariam que nos dessem esta oportunidade”.

Fonte: http://semanal.omirante.pt