Diogo (nome fictício) tem 15 meses e nasceu com um glaucoma congénito. É o mais pequeno de um grupo de 11 crianças cegas ou de baixa visão severa que estão a aprender a contactar com o mundo exterior, na sala de estimulação sensorial da sede de Braga da Associação de Cegos e Amblíopes de Portugal. Os profissionais acreditam que é possível alterar-lhes o futuro, resgatando-os a um provável isolamento.
A terapia não é só para o bebé e para as crianças (dos 0 aos 12 anos) que frequentam o espaço. Nesta faixa etária, é fulcral o envolvimento dos progenitores, para que também estes adequem os comportamentos. Segundo o psicólogo Hugo Senra, no caso dos mais pequeninos, a necessidade, até aos dois anos, de um mundo interno onde coabita com a figura maternal torna a presença da mãe "imprescindível". De resto, "até aos cinco anos, eles dificilmente aceitam submeter-se ao acompanhamento sem a mãe ou o pai", revela ainda.
Diogo é ajudado pelo psicólogo a sentir texturas e sons, através de jogos e bonecos. "Como não vê, a realidade chega-lhe fragmentada. Temos de o ajudar a estimular o tacto e a audição", explica. Através de brincadeiras e sensações tácteis, mãe e filho aprendem a conhecer-se. "É preciso recuperar o prazer da relação, livre dos medos de lidar com uma criança deficiente", acrescenta o profissional.
Os pais vivem, na maioria dos casos, uma sensação de impotência ou até ignorância. Inconscientemente, muitos acabam por maltratar, "por superprotecção ou negligência". Atitudes que podem hipotecar o futuro das crianças. "Há um jovem cego em Guimarães que passa o dia inteiro fechado no quarto, a ouvir rádio. Não sabe ler Braille ou deslocar-se sozinho", conta o presidente da ACAPO, Leonardo Silva. Os casos multiplicam-se pelo distrito. Estima-se que pelos 14 concelhos baixo-minhotos haja 613 crianças cegas e amblíopes, muitas delas "perdidas pelas aldeias". "Um outro jovem que foi estudar para Lisboa pensava que engravidava uma rapariga só por lhe dar um beijo", continua, assumindo que a falta de diálogo prejudica o desenvolvimento regular da criança.
"Aqui também se lhes ensina a distinguir o feminino e o masculino. Parece banal, mas não é. Nós sabemos que é difícil lidar com a deficiência, mas é possível garantir-lhes a autonomia", remata. Na sala de estimulação sensorial, multimodal e destinada a todas as faixas etárias, o grupo de crianças é atendido, mediante marcação. Foram sinalizadas através de colaborações informais entre ACAPO e escolas, infantários ou centros de saúde.
De acordo com Hugo Senra, as instituições devem ver nesta nova valência uma mais- valia. O principal entrave é mesmo a distância. "Não estamos no Porto, aqui é diferente, os transportes não são muitos", refere, exemplificando com um caso de Vizela. Mesmo assim, é possível acompanhar os meninos, ensinando-lhes também coordenação, equilíbrio e mobilidade. Quando estiver completa, a equipa incluirá uma técninca de psicomotricidade e uma terapeuta ocupacional.
Fonte: http://jn.sapo.pt/2006/10/06/minho/criancas_cegas_resgatadas_isolamento....
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