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Jantar às escuras (sim, em Lisboa)

por Lerparaver

Catarina Sacramento foi conhecer o primeiro restaurante da cidade onde se pode comer às escuras.

Tudo começou em Berlim. O Unsicht Bar (que significa 'sem ver') foi o pioneiro da ideia de oferecer aos clientes uma experiência radicalmente nova: jantar na escuridão total. O sucesso foi estrondoso e, claro, depois dele vieram outros, como o Dans Le Noir, em Paris, ou o Opaque, em Los Angeles.

Em Lisboa, não havia até agora nada do género. Leram bem: até agora. Porque a partir de quinta-feira já há: no restaurante Bem-Me-Quer, na Praça do Chile.

Paula Cascais, proprietária deste restaurante vegetariano, sempre gostou de converter a cozinha num terreno aberto à criatividade, mas confessa que este é o projecto mais arrojado em que se lançou. 'Adorava fazer essa experiência, mas como não tive oportunidade de ir a Berlim, fiquei com vontade de proporcioná-la aos meus clientes', explica. A descoberta do admirável mundo novo da gastronomia molecular foi a alavanca que faltava: ficou maravilhada com as possibilidades que podia acrescentar à cozinha. 'É a sequência lógica da comida vegetariana, faz todo o sentido.' Somando 1 + 1, nasceu a ideia de criar aquilo a que chama 'jantares sensoriais': todas as quintas e sextas-feiras uma das salas do primeiro andar fica reservada exclusivamente para este efeito. 'É uma experiência radical, mas não tem apenas um lado lúdico', diz Paula Cascais. Ao privar os seus clientes daquele que é considerado o mais importante dos sentidos, tem dois objectivos: por um lado, estimular os restantes sentidos, obrigando-os a estar mais despertos durante a refeição; por outro, é também um convite às pessoas para se colocarem na pele de alguém que não vê 'e sensibilizá-las para essa outra forma de estar na vida', afirma. Tal como acontece no restaurante berlinense, também aqui a empregada que serve às mesas nestes jantares é cega.

O seu nome é Ana Serôdio e acolheu a ideia com todo o entusiasmo. É a ela que compete ir trazendo os vários pratos, mas antes disso, guiar os clientes, quando chegam, até aos seus lugares na sala escura; explicar-lhes a posição dos objectos na mesa e descrever-lhes o que vão comer. Sem revelar tudo, claro, para não estragar a surpresa.

O menu (de degustação) inclui uma entrada, três sopas, três pratos e três sobremesas, e foi concebido por Paula Cascais em parceria com a Cooking Lab, especialmente para convocar todos os sentidos neste jogo de identificar não só os sabores, mas os cheiros, os sons, as temperaturas, as texturas. 'Os alimentos têm capacidade de despertar emoções', afirma Paula. E em troca paga-se 40 euros (sem bebidas).

Apesar de sabermos que, à partida, quem se submete à experiência já está mentalizado para não chorar nem chamar pela mamã, também é verdade que a coisa pode correr mal. E se uma pessoa entrar em pânico e quiser sair da sala? E se precisar de ir à casa de banho? Está tudo pensado. Não é preciso desatar aos berros e fazer os outros engasgar-se com o susto; basta chamar a Ana, que ela também está lá para isso. Outro pormenor importante: nada de tentar fazer batota e acender isqueiros ou telemóveis: estão ambos proibidos na sala escura. Na divisão ao lado também se pode provar o mesmo menu, mas às claras. 'A comida pode ser a mesma, mas a experiência é completamente diferente', garante.

A expectativa entre os clientes habituais já é muita e ao almoço não se fala de outra coisa. Se o êxito for tão grande como tem sido na Europa, a câmara escura pode vir a transferir-se para a sala maior, no rés-do-chão. A ver vamos (ou não). Jantares sensoriais.

Restaurante Bem-Me-Quer.
Av. Almirante Reis, 152, R/c e 1º esq.
Quintas e sextas ao jantar (por marcação).
Preço: 40€.
Reservas: 21 847 6678 ou bem-me-quer@kanguru.pt