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Filho de Cego sabe Braillar - blog de aquilino

cartelização rima com cooperação, mas são coisas muito diferentes

por aquilino

Hoje fui surpreendido pelo desabafo de um cliente que me disse, em tom conformado, "nós sabemos que em Portugal as empresas de ajudas técnicas fazem cartelização". Veio isto a propósito de uma reparação demorada, e que de facto não se chegou a concretizar. A ser verdade, foi realmente uma situação desagradável, mas reagi com uma mal escondida indignação à suspeita de cartelização. Não é de todo verdade. A cartelização pressupõe um entendimento entre as empresas com vista à fixação de preços, de quotas de mercado ou outros parâmetros, e que desvirtua o princípio da livre concorrência.

Ora, se há coisa que posso garantir a pés juntos é que no mercado dos produtos de apoio para a deficiência visual não há nenhuma cartelização. Pelo contrário, existe uma forte concorrência que ajuda a manter os preços controlados.
Depois ainda expliquei ao meu cliente que exixte, isso sim, uma boa cooperação entre algumas empresas com o objectivo de servir os interesses dos seus clientes. Por exemplo, a minha empresa, a Electrosertec, e a Tiflotecnia decidiram há alguns anos que os clientes de uma poderiam entregar aparelhos para reparação nas instalações da outra empresa, para facilitar as deslocações. E quanto à venda de produtos, é comum a Electrosertec fornecer o leitor de ecrã Jaws quando esse é o desejo expresso do seu cliente, apesar de este não ser o produto representado por si, que é o Hal. O recíproco também é verdade.

Finda a conversa, fui andando mas a pensar neste assunto. Como é importante ouvir a opinião dos meus clientes, pensei eu. Às vezes não ouvimos coisas agradáveis, mas as coisas são como são, e só enfrentando a verdade podemos mudar para melhor.
Cada dia em que abrimos as portas da empresa, sentimos o quão importante é o nosso trabalho para centenas de pessoas. Como esperam de nós uma resposta rápida para os seus problemas e necessidades. E desdobramo-nos em esforços para sermos úteis e agradáveis aos nossos clientes. Mas no fim do dia, ao fechar a porta, é muitas vezes amargo o sabor do nosso trabalho. Algo corre sempre mal: um produto que nunca mais chega do fornecedor; uma reparação que tarda em ficar pronta; um orçamento que já foi pedido há uma semana; a tradução que nunca mais está pronta ah, as traduções!)... são tantas as maneiras de falhar. Porque praticamos os preços de venda recomendados pelos fabricantes, a nossa margem de lucro não é muito grande. Mal chega para manter o funcionamento da casa, e sempre à míngua de mão-de-obra qualificada. É um problema crónico neste pequeno mercado. A menos que se disponha de muito capital, e aí pode-se fazer um brilharete... pelo menos durante algum tempo.
O nosso desafio é o de melhorar sempre a qualidade do serviço, mas sem aumentar os preços, num universo de clientes tipicamente pouco abonados.
Bom ano para todos!
Aquilino Rodrigues