No Dia Mundial da Visão, 8 de Outubro, a Sociedade Portuguesa de Oftalmologia (SPO) frisa as potencialidades, mas também as limitações, da visão artificial. Trata-se de uma possível «luz ao fundo do túnel», mas apenas para «uma ínfima percentagem» dos 37 milhões de casos de cegueira que se registam em todo o mundo.
Nos últimos 20 anos, várias equipas de cientistas internacionais têm trabalhado no campo da visão artificial com o objectivo de restituir a capacidade de ver. O trabalho em torno da criação de implantes epirretinianos (sobre a retina e através do vítreo) ou sub-retinianos (por baixo da retina) é particularmente destacado por Eduardo Silva, oftalmologista nos Hospitais da Universidade de Coimbra (HUC) e membro da SPO.
«Estes implantes têm como objectivo reiniciar o processo visual, entretanto interrompido por uma doença que afecta, fundamentalmente, as camadas de fotorreceptores retinianos ou do epitélio pigmentado da retina», explica o especialista, dando conta que, geralmente, o ciclo visual se inicia nestas duas porções do olho.
Na Alemanha e nos Estados Unidos, estão agora a decorrer os primeiros ensaios clínicos no campo da visão artificial, testando estes implantes em doentes com fases muito avançadas de retinopatia pigmentar. «Os resultados do primeiro ano são muito promissores», nota Eduardo Silva. «Os doentes voltaram a identificar luz e sombras, contornos de grandes objectos e, inclusive, algumas formas. No entanto, esta ainda é uma fase-piloto.»
Com a «rápida evolução» destas investigações, esperam-se, para os próximos dez anos, «dispositivos com uma capacidade de resolução e tolerância ideais». Ainda assim, a ser utilizada, a visão artificial representaria «uma alternativa viável apenas para «uma ínfima percentagem dos doentes que perderam a visão», ressalva o oftalmologista, manifestando preocupação em evitar expectativas demasiado optimistas sobre a visão artificial.
Eduardo Silva admite a utilidade da visão artificial para as doenças degenerativas da retina, a retinopatia pigmentar, as distrofias nos cones (células do olho com capacidade de reconhecer as cores) e bastonetes (células que reconhecem diferentes graus de luminosidade) e as formas secas da degenerescência macular ligada à idade (DMI), que representam 70% dos casos desta doença.
Possível, mas com limitações
O oftalmologista dos HUC explica que a visão artificial pode ser uma solução nas formas secas de DMI, porque, nestes casos, «são, fundamentalmente, as camadas de fotorreceptores retinianos ou do epitélio pigmentado da retina que sofrem uma degradação acelerada com perda da sua capacidade funcional». A integridade anatómica e funcional da restante retina e do aparelho visual (nervos ópticos e todas as demais conexões cerebrais) é, assim, uma «condição sine qua non para o sucesso destes implantes».
A DMI é a primeira causa de cegueira nos países industrializados após os 50 anos de idade, tornando-se cada vez mais frequente devido ao envelhecimento da população. Um estudo desenvolvido nos Estados Unidos mostrou que 10% das pessoas entre os 65 e os 74 anos sofriam desta doença, uma percentagem que chega aos 30% a partir dos 75 anos.
Realçando as potencialidades das inovações em Medicina como fonte de esperança renovada para os casos de cegueira, o presidente da Sociedade Portuguesa de Oftalmologista, António Travassos, lembra: «Muitos dos nossos antepassados cegaram por doenças que, hoje, são raras.» Este especialista nota que, entre as várias áreas da Medicina, «a Oftalmologia é, actualmente, uma das especialidades mais tecnológicas e exigentes» e que, de futuro, a investigação nesta área «será, necessariamente, mais elaborada e objectiva».
Ainda assim, nenhuma cirurgia está isenta de riscos. «Os implantes retinianos da visão artificial estão sempre associados à realização de uma cirurgia algo complexa, com riscos de infecção, rejeição ou reacções inflamatórias exuberantes, que podem agravar um quadro de base já complicado», alerta Eduardo Silva.
Segundo dados da Organização Mundial de Saúde, em 2002, havia mais de 161 milhões de pessoas com deficiência visual em todo o mundo, entre as quais se destacavam cerca de 37 milhões de casos de perda total de visão. A mesma organização estima que 75% dos casos de cegueira poderiam ser prevenidos ou tratados.
Eis as principais entidades que estão a investigar a visão artificial (produção e ensaios clínicos com implantes da retina):
Boston Retinal Implant Project, EUA;
DARPA Neovision Program, EUA;
DOE Artificial Retina Project, EUA;
Doheny Eye Institute, EUA;
EPI-RET Consortium, Alemanha;
European Vision Institute European Economic Interest Grouping;
Indian Armed Forces Medical Services, India;
Intelligent Medical Implants AG, Alemanha;
Optobionics, EUA;
Prince of Wales Hospital, Austrália;
Retina Implant AG, Alemanha;
Retinal Prosthesis Project, EUA;
Sandia National Laboratories, EUA;
Second Sight Medical Products, EUA.
Fonte - http://www.cienciapt.net/pt/index.php?option=com_content&task=view&id=10...
Sérgio Gonçalves
Actualizado em ( 08-Oct-2009 )
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