Póvoa de Lanhoso
"Temos de fazerum pião ou isto é uma seca" 00h30m PEDRI ANTUNES PEREIRA Deficientes visuais do distrito experimentam novas sensações no parque de diversões "DiverLanhoso".
Ricardo, António, Carlos, Luís, o outro António e Fernando vêm de Vizela, Famalicão, Guimarães e Barcelos. Partilham, já há alguns anos, experiências e histórias de vida e em comum têm o facto de serem deficientes visuais.
Luís é de Barcelos e está muito empolgado. Senta-se pela primeira vez num kartcross. Vai concretizar o sonho de conduzir, ainda que com algumas limitações, um carro. Ao lado, ao volante, está o monitor, Ruca. "Temos que fazer um pião, senão não tem piada e é uma seca", diz Luís. Depois de descobrir o carro, desde as alavancas aos pedais, não resiste a desabafar: "Só vamos andar na estrada, porque é que não vamos para o monte?".
Acelerador a fundo, Luís é a alegria personificada, enquanto dá meia duzia de voltas. No final, eufórico, manda bocas ao monitor: "Eu bem que carregava no acelerador, mas ele não deixava o carro andar". Já mais calmo, mas ainda assim muito feliz, agradece terem-lhe dado "o gosto de acelerar" porque um dos seus sonhos era conduzir, e ali teve "uma experiência parecida".
O Visão Radical é um projecto pioneiro em Portugal que tem como principal objectivo, como explica o técnico da Associação de Apoio aos Deficientes Visuais do Distrito de Braga (AADVDB), João Costa, "promover o desenvolvimento pessoal e social das pessoas com deficiência visual, facultando aos associados um conjunto de actividades de carácter desportivo e lúdico numa vertente mais radical, tendo sempre em atenção as necessidades e capacidades físicas de cada indivíduo".
Fruto de uma candidatura ao Subprograma Para Todos 2009, é financiado pelo Instituto Nacional da Reabilitação, com uma verba "não muito comum nestas coisas": 17500 euros, tendo a AADVDB entrado também com algum dinheiro. Até ao final do ano, às segundas, quartas e sextas-feiras, e divididos em grupos por concelhos, "para facilitar o transporte de cada", vão poder experimentar vários desportos radicais.
O presidente da AADVDB prefere falar "do esforço financeiro de uma instituição que vive de iniciativas de angariação de fundos, mas que não pode nem quer estar longe de actividades que dão mais bem-estar aos seus associados".
Sentado numas escadas de madeira, António Lima, de Famalicão, prepara-se para uma descida em rappel. Para quem esteve na guerra e fugiu de balas por instinto, "isto não é nada". Provocado pelos técnicos da associação, António Lima reagia bem-disposto, até na altura de colocar o capacete: "Não tem um com uma caveira? É para dar sorte". Sem receio aparente, ainda teve tempo de explicar a diferença entre cegos e não cegos: "vocês têm medo porque vêem, nós, como não vemos, não podemos ter medo".
Antes de partir, ainda brinca com Ricardo, o próximo a descer: "Já viste a distância disto?". Aprendeu depressa a colocar os pés em posição de segurança e, depois de arrancar, ganhou uma aposta: o grito que os técnicos disseram que ele ia dar foi substituído pela alegria final de quem queria repetir.
Sandra Vieira é, com João Costa, uma das responsáveis pelo projecto e reconhece o valor destas iniciativas no aumento da auto-estima e valorização pessoal: "Ficam especialmente contentes, mais extrovertidos e com mais vontade de realizar outras actividades". A técnica lembra que "é uma experiência que não conseguiram fazer de outra forma e ainda bem que há uma entidade que consegue dar resposta, e que deverá ser falada daqui a 20 anos".
Pedro Vieira, da DiverLanhoso, apresenta o projecto como a prova de que "os desportos radicais podem ser para todos e integradores de pessoas com deficiência numa sociedade que ainda não os acolhe devidamente", e lembra que as actividades foram escolhidas "para lhes dar uma gratificação pessoal: a de que conseguiram".
A manhã terminou com canoagem. Os que ainda não tiveram oportunidade de fazer nada, entram nos barcos e, depois de umas explicações básicas, começam a dar aos remos. A água meio parada é motivo de protestos: "Onde estão as ondas e os rápidos?", ouve-se dizer. Amanhã, outro grupo segue até à Póvoa de Lanhoso e na sexta seguem mais uns quantos. Depois, voltam na próxima semana e vão trocando de actividades. Será assim até ao final do ano.
Um grupo de seis invisuais deu, ontem, o pontapé de partida, no parque de diversões da Póvoa de Lanhoso, DiverLanhoso, de um projecto pioneiro em Portugal, o "Visão Radical" que junta, em três grupos diferentes, 35 invisuais do distrito de Braga.
Fonte: http://jn.sapo.pt/paginainicial/pais/concelho.aspx?Distrito=Braga&Concel...
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