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Vamos reaprender a ler

por Lerparaver

José Adelino Figueira Guerra (Biblioteca Municipal de Coimbra)

1 - Portugal, Um País Que Lê Pouco

2 - O Problema Circunscrito Aos Deficientes Visuais

3 - A Internet como resposta possível

4 - Perspectivas Para Tempos Próximos

5 - Conclusão

1 - Portugal, Um País Que Lê Pouco

"O facto não é novo, mas volta a ser falado na Imprensa Mundial, a constar de estatísticas e a ressaltar de relatórios - em Portugal não se lêem jornais ou lêem-se pouco, o que é quase a mesma coisa..."

(Publico, 31 de Julho de 1999)

É com estas palavras que Sardoeira Pinto comenta os resultados de um inquérito Eurobarómetro revelado em Bruxelas que trouxe novamente o assunto para a ribalta. Segundo tal inquérito, em Portugal apenas 17% dos inquiridos lêem jornais diariamente e 32% nunca. E em relação aos livros, o panorama não é mais animador. Não faltam inquéritos, estudos ou estatísticas a documentar esta triste realidade. Segundo um inquérito encomendado pela Associação Portuguesa de Editores e Livreiros (APEL) à empresa Quantum, em Maio passado, mais de metade dos portugueses entre os 15 e os 65 anos não lê livros e mais de um milhão não tem livros em casa.

2 - O Problema Circunscrito Aos Deficientes Visuais

Se circunscrevermos a nossa atenção num grupo social mais restrito, os deficientes visuais, decerto que concluiremos que as razões socio-culturais que determinam os hábitos de leitura dos portugueses em geral, também são válidas para os deficientes visuais em particular. No entanto, a todas as causas geralmente apontadas (analfabetismo persistente, iliteracia, preço elevado das publicações, bibliotecas insuficientes, etc.), há que juntar uma outra que lhes é específica: o acerbo bibliográfico reduzido (braille e/ou áudio); quanto aos jornais, não lhes são acessíveis directamente, já que as louváveis iniciativas pioneiras do "independente" e do "Jornal de Notícias", não resolveram (nem era esse o seu intento) o problema.

Apesar de não existirem estudos comparativos, entre os hábitos de leitura da população em geral e dos deficientes visuais, parece quase certo que as estatísticas seriam mais penalizantes se fossem exclusivas da deficiência visual, situação agravada nos últimos anos nas classes mais jovens.

3 - A Internet como resposta possível

A Internet aparece assim como uma resposta do futuro cada vez mais presente, para todos, com especial ênfase para os deficientes visuais, já que por esta via pode ser atenuado o déficit informativo e cultural a que têm estado sujeitos. Pela primeira vez, eles têm acesso autónomo e independente a informação escrita assente num suporte não concebido exclusivamente para eles.

Porém, é legítimo questionar de como, quem não estando motivado para ler, o livro ou o jornal impresso, pode vir a descobrir o gosto pela leitura no ecrã de um computador?: Mas não podemos olvidar que o conceito tradicional de leitura está posto em causa pelas novas tecnologias. O computador permite a apresentação ou recuperação da informação de modo não linear. O leitor transforma-se em leitor/autor (interactividade), permitindo um entrecruzamento de sentidos, emoções e razão na leitura.

Estes aspectos abrangentes da cultura informatizada e a sua faceta modernizante atraem em especial os jovens.

Manejar o computador representa perspectivas profissionais; a Internet, acesso instantâneo tanto à informação generalizada como aos meandros mais especializados, altera a noção de tempo e espaço, potencializando a dinâmica da produção cultural e da leitura.

Impõe-se o reconhecimento e a aceitação de leituras que não apenas a da palavra escrita, sobretudo em sociedades onde os níveis de escolaridade ainda são baixos, Até porque a desmistificação da escrita talvez seja um passo para a aproximação dos iletrados com o texto.

4 - Perspectivas Para Tempos Próximos

Relativamente aos deficientes visuais, persistem ainda dificuldades que no entanto têm vindo a ser atenuadas ou ultrapassadas. No que concerne aos aspectos técnicos, a evolução nesta área é vertiginosa; porém, os fabricantes de equipamentos e tecnologia específica têm acompanhado satisfatoriamente essa evolução.

Aos deficientes visuais, preocupa sobretudo o excessivo peso da informação gráfica na informação digital; mas também aqui vão surgindo respostas, como a recente Resolução do Conselho de Ministros, n.º 97/99, que Estabelece regras relativas à acessibilidade pelos cidadãos com necessidades especiais aos conteúdos de organismos Públicos na Internet.

No nº 2, da citada Resolução pode ler-se:

a) A respectiva leitura possa ser feita sem recurso à visão, (...)

b) A obtenção da informação e a respectiva pesquisa possam ser efectuadas através de interfaces auditivos, visuais ou tácteis.

5 - Conclusão

A Internet é uma vasta sala de leitura integrada, onde cada vez surgem mais criadores/utilizadores. Não obstante a sua dimensão planetária, a noção de espaço perde todo o sentido. A interacção entre os seus utilizadores está facilitada e estimulada, não importa se estão no apartamento contíguo ou nos antípodas.

Apropriando-me agora do tema deste painel, "Da Biblioteca Especial à Integração na Biblioteca" não fará sentido algum que as Bibliotecas, disponibilizando acesso à Internet aos seus leitores, não o façam também para os deficientes visuais, no mesmo local e nos mesmos postos de acesso; bastar-lhes-á equipar uma ou mais máquinas (dependendo da afluência e da capacidade financeira) com interfaces específicos, (braille, sintetizador de voz ou ampliado), terminais cuja disponibilidade de utilização por leitores normovisuais em nada ficará prejudicada.