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O altruísmo como divisa

por Lerparaver

por Germano Silva

De vez em quando sabe bem embrenharmo-nos na chamada literatura infantil e desfrutar do prazer que é conhecer uma dessas belíssimas histórias que deixam fascinado quem as lê - tenha o leitor oito ou 80 anos. É o caso de "Madalena e a gatinha pompom", a mais recente publicação de Zita Resende, destinada, naturalmente, a todas as crianças mas, de modo especial, às crianças invisuais. Por isso comporta dois textos, sendo que um é em braille.

Às vezes, para bem se compreender o conteúdo de uma determinada obra, é indispensável conhecer o autor e os propósitos que o levaram a escrever essa mesma obra. Ora, a aparição de "Madalena e a gatinha pompom", profusamente ilustrada com sugestivos desenhos de Maria Keil, foi precedida de uma comovente história que vale a pena evocar.

Há coisa de três anos, Zita Resende ofereceu um dos seus livros a uma pessoa amiga que, por sua vez, o deu a uma criança invisual. Sensibilizada, depois de ter ouvido a história do "Ratinho Malaquias", que alguém lhe lera, a criança a quem o livro fora ofertado escreveu à autora a agradecer-lhe os bons momentos que o conto lhe proporcionara e sugerindo que, no futuro, se não esquecesse das crianças que, como ela, não podiam ler em prosa normal.

Comovida, Zita Resende providenciou no sentido de que o seu próximo livro, então já em acabamento, contivesse um texto em braille. E assim nasceu "Madalena e a gatinha pompom".

A edição, num belo arranjo gráfico de Armando Alves, aí está, nos escaparates das livrarias e com uma característica não menos sensibilizante o produto da venda será integralmente convertido em material didáctico para as crianças invisuais. A Fundação Luís Figo irá dar cumprimento à filantrópica quanto comovente determinação.

A autora de "Madalena e a Gatinha Pompom" não é uma estreante nas lides de escrever para os mais novos contos que agradam aos adultos. Filha de uma poetisa que, sob o pseudónimo de Aziul, encheu os saraus culturais dos cafés portuenses dos anos 60, e mulher de mestre Júlio Resende - o vulto maior da nossa pintura contemporânea -, Zita Resende herdou da mãe a arte de jogar com as palavras, sabendo como construir pedaços de prosa viva e fluente; e aprendeu com o marido a utilidade das cores, esmaltando os contos com o colorido e a leveza com que um artista pinta uma tela.

Na sua última obra, a autora conta a história de Madalena, que "vive numa casa de pedra cercada de vento, branca por fora e azul por dentro"; da sua mãe, "a senhora Josefa" ; do pai, o senhor Barnabé, pintor, que "pintava quadros muito coloridos"; do Serafim, "o peixinho do rio"; e da gatinha que se enroscava em Madalena de modo que mais parecia um pompom do que uma gata.

O texto de Zita Resende e os desenhos de Maria Keil formam uma unidade singular que gratifica o espírito de quem tiver a ventura de os ler e observar.

Fonte: http://jn.sapo.pt/2007/01/21/cultura/o_altruismo_como_divisacancro.html