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Áudio-descrição: Opinião, Crítica e Comentários - blog de Francisco Lima

Um Pouco de História de Inclusão em Pernambuco

por Francisco Lima

“As barreiras atitudinais são comportamentos, ações, atitudes que levam, intencionalmente (de propósito), ou não, à limitação ou ao impedimento de deveres ou direitos das pessoas com deficiência, incapacitando-as total ou parcialmente para exercer a cidadania ou receber os benefícios do direito. As barreiras atitudinais são tudo que discrimina por razão de deficiência, conforme definidas na Convenção interamericana para a eliminação de todas as formas de discriminação contra as pessoas com deficiência - 1999 (Dec. 3956/01 e na Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência e seu Protocolo Facultativo - 2006 (Dec. 186/08). As barreiras atitudinais são abstratas para quem as produz, mas concreta para quem as recebe. São, em suma, formas sociais de ver a pessoa com deficiência, sempre sob a ótica do “diferente” (como se apenas a pessoa com deficiência fosse diferente, enquanto as demais, fossem iguais); forma social de ver as pessoas com deficiência, como se fossem “deficiente”, incapazes ou como sendo apenas elas que têm limitações; forma social de ver as pessoas com deficiência, como se fossem dignas de dó, pena ou privilégio, enquanto, ao mesmo tempo, se lhes nega direitos e tratamento diferenciado que as iguale em direitos e oportunidades.
Tudo isso pode ser dito das barreiras atitudinais, mas há muito mais.”

Prezados,

Há vários anos escrevi a carta que abaixo transcrevo, recepcionando alunos que entravam para o curso de Letras-Libras, aqui na Universidade Federal de Pernambuco, como resultado dos esforços da Profa. Rosângela para que a UFPE aceitasse sediar o polo educacional da Universidade Federal de Santa Catarina.

Em decorrência dessa formação, temos visto nos últimos meses vários professores surdos assumindo cadeiras nas universidades locais/regionais, aprovados nos concursos públicos das universidades públicas Federal e Estadual, o que nos deixa muito felizes e recompensados.
Temos visto, ainda, muitos dos ex-alunos, sendo aprovados em concurso público de entrada nos cursos de pós-graduação, o que mostra que não é a deficiência que impede as pessoas com deficiência de exercer as funções que pretendem, mas são as diversas barreiras que obstaculizam o direito que elas têm à educação e ao trabalho.
Infelizmente, o despreparo da Universidade que, naquela época existia, em nada mudou e os gestores dela ainda obram contra a inclusão dos alunos, a despeito do discurso que proferem e de algumas ações puseudoinclusivas que tomaram parecerem dizer o contrário.
Em função disso, partilho aquela antiga carta com vocês, dizendo que o espírito dela ainda é presente e que, no que concerne a outras áreas de deficiência, a mesma discriminação e a falta de acessibilidade permanecem, isso quando não pioraram.
Cordialmente,
Francisco Lima

Carta de Boas Vindas aos Recém-aprovados para o Curso em Letras Libras, no Vestibular do Curso à Distância da Universidade Federal de Santa Catarina, Polo da Universidade Federal de Pernambuco

Prezados alunos, cidadãos plenos, agentes do destino desta nação:

com emoção, felicidade e e alegria, vemos tornar realidade o acesso de vocês ao ensino superior, conforme prescrito por nossa Carta Magna, com igualdade de condições, aqui representada pelo vestibular que para os alunos surdos aprovados, significou ser em sua língua de comunicação social, a Língua Brasileira de Sinais.
O acesso se deu e o passo seguinte será a luta pela garantia do direito de permanência, de continuidade, de progressão para os níveis mais superiores da educação, com igualdade de condições para alcançarem o sucesso de formarem-se em Letras, escrevendo na história da educação brasileira, um capítulo de cidadania, no seu sentido mais verdadeiro, pleno e respeitoso dos direitos humanos.
Com isso vocês provaram que são capazes de ocupar o espaço social de cidadãos, agora, provarão o gosto do dever de abrirem, para os que virão depois de vocês, caminho nesta mata fechada conhecida por Universidade.
Em alguns momentos, a mata será mais densa e inóspita, em outros, contudo, será acolhedora, revigorante e provedora.
Em todos os momentos, contudo, jamais deixem de acreditar que estão aqui por terem feito por merecer, por terem direito de aqui estar, por terem direito de, daqui, irem para bem mais longe na vida acadêmica.
A cada empecilho que que encontrarem, não desistam, pelo contrário, nutrem-se na energia daqueles que, lutando antes de vocês, e com a força de que dispunham tornaram possível com que vocês chegassem aqui, neste momento memorável e que não será esquecido pela ação de um tempo que muitas vezes nos faz esquecer que antes de nós, pessoas valorosas lutaram para que hoje pudéssemos exercer nossa cidadania, isto é,de sermos reconhecidos como pessoas humanas completas, detentoras de todos os direitos humanos fundamentais.
Em quanto professor desta Universidade, enquanto Coordenador do Centro de Estudos Inclusivos, enquanto pessoa com deficiência, dou-lhes minhas boas vidas e expresso meu desejo de que tenham o maior sucesso possível nesta empreitada que hora começam.
Um passo foi dado, muitos outros ser~~ao necessáro, antes que possam parar e dizer conseguimos, chegamos lá. E isso, de fato, só será dito, quando vocês virem, como hoje vejo, que o que fizeram, possibilitou a outros alcançarem o lugar que antes vocês próprios l+a estiveram:
Um dia, um jovem, já não tão jovem assim, esteve onde vocês estão agora, no primeiro dia de aula, numa universidade, hoje, ver vocês aqui, faz-me ter a certeza de que valeu a pena, pois posso reviver , por meio de vocês os sentimentos que tive naquele momento, o sentimento de um sonho se tornando realidade.
Meus alunos, façam os sonhos de vocês tornarem realidade também e se para isso precisarem gritar, gritem, se for preciso lutar, lutem e se for preciso pedir ajuda, primeiro certifiquem 'se de que o que se lhe estará sendo oferecido já não é de direito de vocês, pos se o for, não peçam, exijam!
A Universidade jamais recebeu, de uma só vez, tantos alunos com deficiência antes, portanto não sabe, como ademais o resto da sociedade não sabe, lidar com as demandas de vocês e para isso vocês deverão nos ajudar, dizendo que devemos fazer para que respeitemos seus direitos de acadêmicos; a Universidade, jamais pensou na pessoa com deficiência, como potenciais alunos e como alunos com potencial, assim, nunca se preparou para respeitar os direitos de cada um de vocês de estarem aqui, valendo-se de dos serviços providos por ela Universidade, portanto, ocupem todo e cada espaço desta Casa , fazendo com que ela os veja, fazendo com que ela responda às demandas pertinentes à especificada/necessidade do aluno surdo, do aluno com deficiência.
Agora, vocês estão aqui, tornem-se visíveis, nas cantinas, nos restaurantes, nos departamentos, nas coordenações na reitoria, em todos os espaços desta Universidade, pois ela é de vocês e vocês têm o direito de a ocupar e ser, por ela respeitados.
Contem com este professor e, dele, não exiam menos que exigiriam de qualquer outro professor, pelo contrário, demandem, pois terão em nossa pessoa, um implacável defensor do direito de vocês de serem acadêmicos plenos nesta Universidade pública, desta Universidade custeada pelo público, cidadãos Brasileiros, muitos dos quais jamais frequentarão os bancos desta Universidades, nem os seus filhos o farão.

Caríssimos professores, colegas de Universidade,

estejam vocês em que posição administrativa for, como chefe de departamento, como coordenador de área, como diretor de Centro, como pro reitor ou reitor, sempre argumentamos que a Universidade não está preparada para atender aos alunos com deficiência e outros em situações de vulnerabilidade, porque não tinhamos demanda. Tal argumento, ainda que frágil, tem tido força suficiente para que não
Nos mobilizemos por uma educação, verdadeiramente para todos, onde neste todos estejam as pessoas com deficiência.agora a demanda está entre nós: apenas na UFPE, temos
Com a chegada deste alunos, 32 acadêmicos surdos, sem contar os alunos com deficiência visual, com deficiência física com dislexia, hiperatividade, com autismo e outros, muitos dos quais, sequer nos damos conta da existência deles entre nós, assim, façamos aquilo que é de nossa ob ligação, que é de nosso ofício, aquilo para o que somos pagos, oferecer uma educação de qualidade. E não haverá uma educação com qualidade nesta Universidade se não for para todos, isto é, se não considerarmos nossos estudantes com deficiência; não haverá educação com qualidade enquanto não ensinarmos por meio de nossos exemplos, o respeito, a moral e a ética e estes só existirão entre nós, se respeitarmos a todo e cada aluno, dentro de suas necessidades e a todos, sem exceção, como pessoa humana..

Magnifico senhor reitor,
esta Universidade tem como lema: UFPE para todos, porém, constantemente, a falta de acessibilidade, física, comunicacional e outras, somada às barreiras atitudinais e, de fato, decorrentes destas, têm feito desta
Universidade uma universidade que para todos, todos os que, sendo cadeirantes, não podem passar pelos portões giratórios que, sendo pessoas com deficiênciincrito a visual, não podem valer-se dos equipamentos ou mobiliários por não terem acesso físico ou comunicacionais a eles etc. O argumento do despreparo, da falta da demanda e a alegação da falta de recursos econômico-financeiros têm servido para que não cumpramos, de fato este lema que é uma bandeira digna desta grande Universidade, assim, façamos a diferença e esculpamos na história da UFPE uma universidade para todos. Isso feito (e o senhor tem a oportunidade de o fazer) terá o nome inscrito na história desta casa e da educação brasileira, como aquele educador que fez, que não deixou por fazer, que tendo passador por esta universidade, não deixou que ela passase pelo senhor.
Conte conosco, conte com cada colega da academia, com cada aluno com deficiência ou não para que juntos possamos fazer uma UFPE para todos.

Excelentíssimo senhor presidente da república, senhor ministro da educação, amigos da UFSC, responsáveis pela realização do Letras libras,
um pequeno passo, demos para a educação dos cidadãos com deficiência, para os cidadãos surdos, um minúsculo passo para uma educação efetivamente inclusiva, onde nessa educação estejam contemplados todos todos os cidadãos brasileiros em grupos vulneráveis, como as pessoas negras, os índios o mais pobres etc., mas é apenas um pequeno passo, um minúsculo passo, considerando a distância que ainda temos de encurtar, para que essas pessoas estejam em pé de igualdade de oportunidade e condições com a minoria que já chegou lá, visto de outro prisma, entretanto,, são passos gigantescos, pelos quais os senhores serão, certamente, recompensados pelo que fizeram e pelo que certamente ainda farão por uma sociedade mais justa e respeitosa dos direitos da pessoa humana.
E a recompensa virá, quando daqui uns anos, estes alunos então formados, estamparem em seus rostos o sorriso de felicidade e em suas mãos, a razão dela, o diploma de letrados em Libras, licenciados e bacharéis em língua brasileira de sinais, profissionais preparados para contribuir para uma melhor construção deste nosso Brasil.
Muito obrigado e bom estudos para todos.
Francisco Lima