Por: Ana Paula Nogueira Tavares Gomes
Define a Lei, no 71/98 de ; de Novembro (Bases do enquadramento jurídico do voluntariado), o voluntariado como o conjunto de acções de interesse social e comunitário realizadas de forma desinteressada por pessoas, no âmbito de projectos, programas e outras formas de intervenção ao serviço dos indivíduos, das famílias e da comunidade desenvolvidos sem fins lucrativos por entidades públicas ou privadas.
Define ainda, a mesma Lei, o Voluntário como o indivíduo que de forma livre, desinteressada e responsável se compromete, de acordo com as suas aptidões próprias e no seu tempo livre, a realizar acções de voluntariado no âmbito de uma entidade organizadora.
No entanto, não consigo encontrar grande interesse nesta Lei, pois não existe nenhum enquadramento jurídico, uma vez que não está regulamentada. Então de que nos serve conhecê-la, ou mesmo tê-la?.
Além disso, os conceitos são tão vagos, são tão gerais, que deixam muitas questões por resolver. Como por exemplo, proponho que analisemos o seu artigo 4o : Consideram-se organizações promotoras as entidades (...) que reúnam condições para integrar oluntários e coordenar o exercício da sua actividade. Mas que entidades serão estas? Como serão analisadas, avaliadas e acreditadas?
Mas para não nos perdermos nesta nossa análise, proponho que encontremos um método, que peguemos no problema de alguma maneira. O que pretendo com a minha exposição não é de forma alguma encontrar respostas ou soluções, não é minha função! O que procuro é criar, aqui, um espaço de debate de ideias, de troca de experiências e de análise conjunta desta problemática
Sugiro então que abordemos o problema por três vertentes:
- - O Voluntário
- - A Instituição
- - A Sociedade
Quanto ao voluntário, quem é realmente o voluntário? Que qualificações tem? Que perfil? Será que qualquer um de nós poderá ser um bom voluntário? E que trabalho é esse de voluntariado, ou melhor, o que é que ele vai fazer, e em que circunstâncias? Não será muitas vezes o que os outros não querem. .
Na vertente das Instituições. Estarão estas preparadas para receber voluntários? Vejamos, refere a mesma Lei de Bases, citada anteriormente, no ponto 5 do Artigo 6o: O princípio da complementaridade pressupõe que o voluntário não deve substituir os recursos humanos (. . . ) das organizações promotoras (. . ) Pergunto mas não poderão constituir, estes mesmos recursos humanos, um entrave ao aparecimento de um voluntário? Não será este visto como um intruso a uma estrutura supostamente estabilizada e não provocará isso algum incómodo? Ou então, não contará a Instituição com mais uma unidade que depois não funciona, pois não há responsabilização? Resumindo, será que as Instituições querem realmente voluntários?
E a Sociedade, quererá esta sociedade voluntários?
Desde que nascemos, que vivemos em grupo O primeiro que conhecemos é a família. Desta somos inseridas na escola, no trabalho, nunca nos desligando daquele que é o nosso grande grupo em que estamos mais ou menos, melhor ou pior integrados na Sociedade. Mas toda a sociedade é regida por regras, por normas. Desde as regras de convivência caseiras, às regras e normas de qualquer instituição de ensino e qualquer entidade empregadora, que vivemos num constante regulamento. Poderemos nós então considerar que funcione, correctamente, uma unidade sem regras?
É certo, que em Instituições como as nossas, o trabalho de voluntariado poderia ser muito importante. É natural que todos os que defendemos a solidariedade social e que conhecemos melhor que ninguém casos e situações de pessoas que necessitam de apoio e de carinho e que, muitas, vezes não há ninguém disponível para lhes dar, nos revoltemos com esta situação. Mas, pensando bem, quantas instituições não necessitam de bens materiais, sem ser trabalho humano. Quantas instituições não necessitam de ver melhoradas as suas condições, os seus espaços e às quais também ninguém lhes dá o seu apoio. Os subsídios não existem e quando existem são escassos. E no fundo toda esta situação poderá perfeitamente desmotivar aqueles que trabalham para as instituições, quanto mais aqueles que dariam algum tempo disponível, sem remuneração, para estarem, muitas vezes, em condições precárias, a trabalhar sem materiais e em espaços desagradados.
Bom, penso que já me alonguei demasiado, em questões. Mas para terminar deixo uma última pergunta, para analisar e para reflectir, que no fundo está na raiz desta problemática e possivelmente aquela pela qual deveríamos começar:
Numa sociedade de consumo como a nossa em que todos os dias somos bombardeados com spots publicitários que apelam à aquisição de bens cada vez mais e melhores será aceitável querer-se que alguém "trabalhe de graça"?
Dra. Ana Paula Nogueira Gomes Licenciada em Educação Especial e Reabilitação
Faculdade de Motricidade Humana Universidade Técnica de Lisboa
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